sexta-feira, 18 de março de 2011

MÉDICO, PROFISSÃO HUMORISTA

A quem me lê hoje. 
A quem me lerá meses após na sala de espera de um dentista.

Era um senhor inflexível em suas posições ideológicas, daqueles que tentam a todo custo fazer proselitismo. E a nossa conversa, naquele domingo (que merecia coisa melhor), tinha sido marcada pela aspereza. Avisado por terceiros de que eu escrevia humor, ao fim do entrevero verbal, o meu adversário sai-se com esta: "Ah, então toda essa nossa conversa vai ser publicada?! Pois eu vou ler no jornal".
Fechei-me para meditar sobre aquela proposta - um autêntico tirar leite das pedras!
O que os colegas humoristas escrevem não nos dá assunto. Mostra-nos a técnica, os recursos utilizados - o que não é pouca coisa - e, por vezes, nos inspiram para analogias. O assunto mesmo nós temos é que tirar do quotidiano, da leitura de um livro bem cacete, dos programas de TV... Daquele "tijolão" que, ao ser aberto, esvoaçam as traças. E que, no meio delas, está a musa que preside o humor.
Um equívoco é pensar que o escritor de humor sabe contar uma boa anedota. Ora, numa roda de amigos, raramente eu me lembro de uma... por mais que esprema a memória. Apesar de já ter arquivado nela as "Anedotas do Pasquim", do primeiro ao oitavo volume, as obras completas do Chico Anysio e os casos gauchescos. E se, acaso, de uma delas eu me lembrar, para que vai servir? Não vou saber desembuchá-la como faz um bom contador de piadas.
Uma piada é um diamante bruto a ser lapidado: isso é tarefa para um escritor. Mas a lapidação que ele faz não extingue  o diamante que continua a existir na joia. À espera de um contador de piadas que lhe retire as novas faces que a lapidaria lhe acrescentou.
Outro engano é imaginar que o humorista é uma pessoa sempre agradável e comunicativa. A ser colocado no mesmo plano do comediante, do clown e do bobo da corte. Ledo ivo engano. Há-os inclusive coléricos e irascíveis. E há os que se fecham num imutável mutismo como o genial Luís Fernando Veríssimo. Que não perde a linha nem quando atende o telefone.
Não conheço LFV. E passo adiante o que Carlos Eduardo Novaes disse sobre o colega, enquanto papeava com admiradores no restaurante "Trattoria", aqui em Fortaleza.
Mamma mia! Ainda bem que a moda do "piadokê" acabou logo.

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