quarta-feira, 27 de novembro de 2013

EMBARCOU, TEM QUE REMAR

Sobre o quadro Poeta, de Leon Girardet:


É uma cena romântica: um rio (ou será um lago?), um barco, um poeta e três raparigas em flor. O poeta faz um recital dos últimos poemas que escreveu. Cada uma das moças deve se imaginar a própria musa inspiradora de um, vários, muitos desses poemas... Até de todos, se uma delas for bisavó da Luana Piovani.
A propósito, não é uma cena contemporânea. O figurino das pessoas mostra que não pertencem ao nosso tempo. O bardo mantém uma distância respeitosa das três raparigas, que se acotovelam num dos cantos da embarcação. A qual, por sua vez, está quase encalhada no capim aquático.
Mas... há remos no barco à espera de braços dispostos. Não se faça de rogado, meu poeta. Está a terminar a leitura do livro em suas mãos, agora é empunhar os remos. E levar o barco, as moças, a si próprio para novas paisagens. Onde o enlevo, o encanto, o arrebatamento, tudo é feito sem palavras.
Sim, faça isto. Para não ser depois recomendado à Sociedade dos Poetas Mortos nas Calças.
Original: EM, 22/06/2007

quarta-feira, 20 de novembro de 2013

NÚMERO COM APELIDOS

São em grande parte uma contribuição do loto ou jogo do víspora. Um jogo em que cada participante dispõe de um ou mais cartões, com fileiras de números que vão sendo marcados, à medida que as pedras numeradas correspondentes vão sendo tiradas de um saco. O jogador que, em primeiro lugar, conseguir marcar todos os números do seu cartão “bate” (ganha) o jogo.
Para o divertimento acontecer uma pessoa fica responsável por “cantar” as pedras. Isto é, por realizar o sorteio. A qual vai anunciando aos participantes os números das pedras tiradas, numa linguagem por vezes curiosa. Com alguns números – seja para quebrar a monotonia do sorteio, seja para dar mais clareza aos números “cantados” – sendo chamados por apelidos. Expressões que o “cantador” sabe serem do conhecimento dos jogadores, tais como:
1 – ronco do porco
7 – conta do mentiroso
8 – violão sem braço
18 – dos outros
22 – dois patinhos na lagoa
33 – idade de Cristo
44 – quá, quá, quá
45 – meio do caminho
81 – o gordo e o magro
90 – não venta
Até o número 25, o que comanda o sorteio pode apelar também para o jogo do bicho. Pelo menos, para seus números mais conhecidos: o 5 (cachorro), o 24 (veado) e o 25 (vaca).
Como o víspora tem 90 números, daí em diante valerá a criatividade do “cantador”.
Original: EM, 17/06/2007

quarta-feira, 13 de novembro de 2013

PEDRA, PAPEL E TESOURA

Um dia, eu dei de presente a meu filho Érico, então um menino de sete anos, um videogame da marca Master System II. Um brinquedo que trazia, em sua memória, o jogo eletrônico Alex Kidd in Miraculous World, para iniciantes. Participando do jogo, através do joy stick, Érico e eu (que fui seu mestre nos primeiros dias) fazíamos Alex quebrar rochas, dirigir veículos, saltar abismos, percorrer cavernas, mergulhar em águas profundas... E, ainda, ajudávamos o herói-menino a enfrentar e a aniquilar terríveis inimigos, muitas vezes com os poderes especiais que lhe conseguíamos.
Todavia, no Miraculous World, existiam mudanças de fase em que, para Alex prosseguir, tinha que vencer um inimigo. Num torneio de pedra, papel e tesoura: um jogo dentro do jogo! Isto foi para mim uma novidade, pois eu só conhecia o par ou ímpar, o cara ou coroa e o jogo dos palitinhos. Mas logo aprendi como era o pedra, papel e tesoura. Alex e o inimigo duelavam mostrando, um a outro, uma das mãos. A mão fechada era pedra, a mão aberta, papel, e a mão com dois dedos esticados, tesoura.
Sempre uma opção vencia a segunda e perdia para a terceira. Eis como entender essa regra, a partir de suas justificativas:
.....pedra x tesoura: vence a pedra (porque quebra a tesoura)
.....tesoura x papel: vence a tesoura (porque corta o papel)
.....papel x pedra: vence o papel (porque embrulha a pedra)



Depois de algumas partidas ficamos craques. Pois cada inimigo jogava o pedra, papel e tesoura de uma forma pré-estabelecida. Mas, para falar a verdade, enquanto funcionou o nosso Master System II, jamais os três (Alex, Érico e eu) derrotamos o último chefão do Miraculous World. Aliás, naquelas morosas partidas (que não davam direito a salvar os resultados), raríssimas vezes conseguimos entrar em seus aposentos no castelo do Mal.
Original: EM, 18/05/2007

quarta-feira, 6 de novembro de 2013

SOBRE MALAPROPISMOS

Nonato Albuquerque publicou na Antena Paranoica uma postagem sobre este assunto (aqui), recentemente. O malapropismo consiste em empregar uma palavra em lugar de outra que tem o som parecido. E origina-se da expressão francesa mal à propos (mal a propósito). Embora, muitas vezes, aconteça por confusão, lapso ou ato falho de quem a profere.
Como causa efeitos cômicos no discurso é um recurso muito utilizado nas comédias. Em 1774, Richard Sheridan, em The Rivals, criou uma personagem, a Sra. Malaprop, de cuja boca brotavam os deslizes verbais da peça. Modernamente, encontraríamos, na televisão brasileira, na personagem Ofélia (aquela que só abre a boca quando tem certeza) uma perfeita discípula da Sra. Malaprop. E, na televisão mexicana (com a repercussão do seu programa no Brasil), em Roberto Bolaños, com as falas do seu personagem Chaves.
Vicente Matheus, diretor do Corinthians por oito mandatos, ficou famoso também por seus malapropismos. Do tipo: “Peço aos corinthianos que compareçam às urnas para naufragar a nossa chapa.”
E tampouco estão livres dessas brincadeiras fonéticas os nomes das pessoas. Como exemplos, Carolina de Sá Leitão, cujo malapropismo é... Caçarolinha de Assar Leitão, e Quintino Reis da Costa, chamado de... Quinhentos Réis da Bosta pelo presidente de uma seção eleitoral ao tempo da República Velha (RS).
Original: EM, 07/05/2007