sexta-feira, 10 de junho de 2011

OS INÚTEIS

Fortaleza, 5 de setembro de 1991

Caro Neno,
Aí vai uma sugestão: você, através de sua coluna, promover o concurso que vai escolher a categoria mais socialmente inútil. Aproveito, desde já, para inscrever o pastorador de carro, o pichador, a carpideira, o tarólogo, o espelho-sem-luz, o pescador de águas turvas, a alcoviteira, o peru do jogo de cartas, o aspone e o vice-presidente da República.
Sem essa de achar que quem costuma escrever carta para jornal deve também participar.
Um abraço Fortaleza-Aurora.

Paulo Gurgel
Água Fria

(...)

Está aí um concurso que eu gostaria de ver. O concurso para a escolha da categoria mais socialmente inútil neste país.
A arraia miúda teria lá os seus concorrentes. Este que chupa parafuso até que vire prego, aquele que enxuga gelo com toalha quente, aquele outro que escova urubu até que fique branco. Etc. Toda uma galeria de tipos exóticos que ainda não aprenderam que, para vencer na vida, o sujeito tem que suar a camisa.
Deus disse comerás o pão com o suor de teu rosto. Suavizou a pena, não foi? Na prática, é com o suor do corpo inteiro - para a alegria dos que apostam nisso, os fabricantes de desodorantes.
Nem todo trabalho é socialmente útil. Traz a mitologia grega o exemplo de Sísifo, com seu interminável trabalho de fazer subir uma pedra ladeira acima. Mas Sísifo era um condenado pelos deuses. Por livre opção, ele não enfiaria um prego numa barra de sabão.

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