sexta-feira, 9 de março de 2012

TURMAS

Quando era moleque, algumas vezes acompanhei a turma do bairro numa insensata missão. Circular em bando pelas ruas de outro bairro - por pura provocação! Iniciando (ou revidando)  o que eles faziam com a gente quando vinham a nosso bairro. Havia troca de palavrões, mostrar de músculos e, ao final, uma correria da turma visitante, o que geralmente impedia de o conflito assumir maiores proporções.
Vivermos em bairros diferentes era o único fato que alimentava essa rivalidade. A sociologia, a que cabe elucidar essa forma de comportamento grupal, deve ter alguma explicação. Do tipo: um grupo hostiliza outro grupo por que aquele vê neste como que uma ameaça à sobrevivência. E, transportando isso para a relação entre as nações, entende-se por que as guerras são um nunca acabar.
Na história contemporânea a gente vê o quanto o povo de um país pode ser induzido ao estado de beligerância. Se lhe oferecem uma liturgia de signos, paradas, hinos, oratória marcial, culto à raça e uma arquitetura monumental e triunfalista. Se lhe incentivam a se organizar em legiões e milícias juvenis. Goebbles, Hitler, Mussolini, Stalin, Peron, Mao, Franco e Salazar foram grandes manipuladores desse universo kitsch.
Meu lugar era na retaguarda. Que é onde deve ficar o serviço de saúde de uma tropa.

DE UM TRATADO DE GUERRA PUERIL
  1. Toda e qualquer desavença poderá ser a causa do estado de beligerância. (1)
  2. As armas permitidas serão as atiradeiras. (2) O uso de outros instrumentos de combate será considerado um procedimento aético.
  3. A munição necessária para a refrega será suprida pelas carrapateiras que existem nos terrenos baldios do bairro.
  4. No calor da contenda serão toleradas as referências desabonadoras às mães dos combatentes.
  5. Não existirá a figura do prisioneiro de guerra. Todos terão que lutar até o fim.
  6. As partes beligerantes acordam suspender o combate um pouco antes da hora do jantar. (3)T
(1) Inspirado no Tratado de Guerra dos Adultos
(2) Sinônimos: bodoques, estilingues, baladeiras.
(3) Para recomeçar tudo no dia seguinte.

A vantagem era que "ninguém matava, ninguém morria".

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