sexta-feira, 23 de abril de 2010

À SOMBRA DOS SAPATOS IMORTAIS

A propósito de uma pergunta sobre o que fazer com os sapatos de Imelda Marcos, tenho alguma sugestões.
Bem, antes de tudo, fico na dúvida acerca da quantidade exata dos pares de sapatos que aquela senhora na atualidade possui. Estima-se que sejam mais de cinco mil pares. Agora, dizer exatamente de quantos se compõe o acervo acaba não passando tudo de um chute (ora, bolas). E dos mais desajeitados porque, ao que parece, não há chuteiras no lote da viúva. Só sapatos finos, adquiridos com parte dos cinco bilhões de dólares com que se calçou o marido, o ditador Ferdinand, ao tempo em que esteve no poder.
Como era a fórmula: enquanto Dona Imelda fazia da vida sapato, Dom Ferdinand, mais abrangente em sua atuação, ia fazendo gato e sapato. Com o povo e o erário das Filipinas.
Mas, as sugestões. A primeira é jogar tudo no vulcão Pinatubo para exorcizar o mal que a ditadura Marcos causou ao povo filipino. Entretanto, resisto a essa ideia: que culpa tem o vulcão? Além de que o Pinatubo, cujo temperamento é reconhecidamente explosivo, não ia engolir a coisa quieto. Na primeira oportunidade, o vulcão devolveria a carga de sapatos ao meio-ambiente. Disso resultando que o arquipélago ficaria qual um imenso panetone - com os sapatos de Imelda fazendo as vezes de frutas cristalizadas!
A sugestão de distribuí-los com a população carente é demagógica. Derrapa na "pododiversidade" e lá poucas mulheres calçam o número de Dona Imelda. Uma dublê de pés dela e meia dúzia de "sociolatas", não mais que isso, seriam as pessoas contempladas pela medida.
Por isso, a ideia mais plausível é criar o Museu do Sapato. Mas sem essa de contar com os sapatos da defunta! Não precisa morrer a viúva Marcos para que a República das Filipinas tome tombe todos os seus sapatos. Aliás, todos... menos um par de pantufas que lhe seria deixado para fazer sapateado no xadrez. Encarregar-se-ia o Estado de os desempoeirar, lustrar e desodorizar... E de botar meia-sola quando bastante andado estivesse o exemplar. Após o que, alertando os curiosos para que não fossem além dos sapatos, seriam estes colocados em exposição no museu.
Com esta destinação proposta para os sapatos, creio haver cortado o nó górdio de seus cadarços.

Data da publicação no Jornal do Leitor: 22/05/94

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