terça-feira, 14 de setembro de 2010

SOFRENDO NOS COUROS

- Expedito.
Ele levantou a cabeça e espiou na direção de quem o chamava. Era o patrão. Ainda deu para acrescentar a rubrica num documento e, sem outra demora, deixar o seu birô para ir atender ao chefe. Assim era Expedito, o mais antigo e graduado funcionário daquela firma de exportação de couros. Trinta anos no batente haviam feito dele um homem de confiança da direção. Sempre a postos para esclarecer um detalhe burocrático ou solucionar alguma pendência.
- Expedito.
E lá ia o solícito funcionário aplicar a sua tarimba a serviço da casa. Tinha o maior salário do quadro de empregados. Embora não fossem lá grande coisa os 100 mil cruzeiros que recebia ao término de cada mês de trabalho (vissem que mal dava para as despesas usuais com si próprio e com a família). No entanto, mesmo passando por essas dificuldades, jamais se animara a procurar emprego melhor. Acomodara-se com o status profissional ali conseguido.
Como a empresa vinha atravessando uma crise financeira - rumores de falência eram ouvidas nos corredores - ele procrastinava pedir uma melhoria salarial. Esperando um tempo mais propício para esse tipo de reivindicação. E, nesse compasso de espera, Expedito tomou conhecimento de que a situação era pior do que imaginara. O patrão, numa conversa franca, lhe propôs uma redução temporária no salário que o auxiliar ganhava.
"Em 50 por cento", disse-lhe o patrão, "ficando o seu salário em 50 mil cruzeiros. Mas só até que a empresa supere suas dificuldades atuais".
Ora, se Iacocca topou ganhar um dólar por ano até reerguer a Chrisler, por que Expedito não ia aceitar o sacrifício para ajudar a sua empresa? Aceitou. Esperançoso de que não ia durar muito o sacrifício proposto pelo chefe.
E, de fato, não durou. Alguns meses após, o patrão chamou Expedito para uma nova e auspiciosa conversa. A firma fechara grandes contratos de exportação e havia recuperado a saúde financeira. E ele não esquecera o desprendimento com que o fiel empregado ajudou a salvar a empresa. Como prova de reconhecimento, Expedito ia agora ter um reajuste de... 100 por cento no salário.
"É uma forma de compensar - com vantagem - a perda anteriormente sofrida", acrescentou o patrão.
O que fez Expedito retornar a seu salário de 100 mil cruzeiros.

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