Mamar é sugar o leite do seio materno ou das tetas de uma fêmea de animal, conceituou Houaiss, o Enciclopédico. Purismos à parte, no verbete "mamar" Houaiss usou a palavra seio, no lugar da palavra mama, conscientemente sabendo que o seio é a região anatômica que fica entre as mamas, isto é, o vão que existe entre elas.
Mamas são as glândulas que a natureza fez surgir na mulher em função da criança. Embora se diga que, à maneira do autorama, quem brinca com elas é o pai.
Com o verbo mamar, o povo tem criado locuções curiosas. Se o ato de mamar é feito na fêmea do cavalo, diz-se que o indivíduo é um "mama-na-égua", ou seja, é palerma, toleirão; se, diferentemente, é um "mama-na-onça", é intrépido, corajoso. "Mama-na-onça", conforme o entendimento popular, é também o indivíduo casado com mulher feia, o que, aliás, dá no mesmo. E há o "fora os anos que mamou", que o povo alterna com o "fora os anos que andou de bicicleta", para dizer que alguém tem mais tempo de vida do que apregoa.
Mamar é também gíria para fumar e beber. Significando fumar - com delícia - a gente encontra em Silva Barros, quando diz: "... continuou sentado, 'mamando' um charutão". E, como sinônimo de tomar bebedeiras, embriagar-se há uma maior fartura de exemplos. Luiz Peixoto, letrista de Ary Barroso, deixou-nos, entre as páginas antológicas do cancioneiro popular, duas amostras do emprego do verbo mamar com esta acepção. Em "Camisa amarela": "o meu pedaço na avenida estava bem 'mamado' / bem chumbado, atravessado". E, em "Na batucada da vida", esta passagem: "depois do meu batismo de fumaça / 'mamei' um litro e meia de cachaça / bem puxada".
Mamar, além de beber, é desinibir-se. Nestor Holanda, em "Telhado de vidro", assim exemplificou: "Então, Manuel Alves Pinheiro foi ao boteco da esquina e tomou algumas calibrinas. Em outras palavras: mamou coragem."
Mamo coragem, também. Ano passado, um ministro da área econômica vituperou que o empresário brasileiro só pensa em "mamar nas tetas da nação". E considerou-se acima de qualquer suspeita por ter nome de peixe (perdão, leitores, ele tem nome de um animal pisciforme. porém mamífero).
Uma vaca que pasta no céu e é ordenhada na terra é a velhíssima ideia que se tem do Brasil. D. João IV, o Restaurador, dizia que éramos a "vaca de leite" da Monarquia. Em tempos atuais, Brizola, afrontando um desafeto político, lançou-lhe a anátema de que "não mamou... mas segurou a vaca para que os outros mamassem".
Por qualquer prisma que se olhe o país, a gente só vê mamadores.De um lado, são os "leitessugas" da casta da especulação, do conchavo e da mamata (como cabe aqui esta palavra!). Do outro, são os enjeitados da sorte que mamam... no dedo, ora bolas.
A propósito, bezerro enjeitado escolhe teta?
(texto da década de 1980, concluído recentemente)
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